Um título como esse pode gerar a suposição de que recomendarei aos concursandos que aproveitem o feriado para uma boa revisão, ou para fazer um simulado e corrigi-lo. Não é má ideia. Mas aproveitar este período para recarregar a bateria, se desestressar e dar atenção ao cônjuge ou aos filhos também é uma boa opção.
Quero ir mais longe, lembrando ao leitor a origem da páscoa. O povo de Israel tinha ido para o Egito, levado por José, que alcançou o cargo de segundo homem no governo, estando abaixo apenas da autoridade de Faraó.
Passados muitos e muitos anos, os judeus se transformaram em escravos, sendo submetidos a tratamento cruel e degradante. Mesmo assim, seu crescimento populacional passou a ser visto como uma ameaça aos egípcios. A solução foi simples: matar todos os recém-nascidos do sexo masculino, lançando-os ao Nilo.
A mãe de Moisés, um recém-nascido judeu, colocou-o num cesto e pediu que a irmã de Moisés, Miriã, o vigiasse de longe. O cesto foi encontrado pela filha do Faraó e Miriã, muito esperta, apresentou-se e perguntou se eles não queriam uma babá. Moisés, assim, cresceu sob a marca de duas culturas. Já adulto, tomou a defesa de um judeu que estava sendo açoitado, acabou matando um soldado egípcio e fugiu para o deserto.
Foi no deserto que Deus apareceu a Moisés, no meio de um arbusto que, mesmo pegando fogo, não se consumia. Foi ali que ele recebeu a missão de levar o povo de Israel do Egito para Canaã, a Terra Prometida, onde manava leite e mel.
Assumindo o encargo, Moisés voltou para o Egito e apresentou ao seu povo os planos de Deus. Engana-se quem imagina que ele foi bem recebido. Ao contrário, foi visto por seu povo com desconfiança. E, perante os egípcios, como traidor. Traidor... e tolo. Afinal, Moisés abriu mão dos privilégios de ser considerado filho de faraó. Daí em diante, todos conhecem a história: vieram as dez pragas e finalmente o povo foi autorizado a sair do Egito.
Tão logo os judeus tinham saído, o Faraó muda de ideia e determina ao seu poderoso exército que persiga os judeus. Nessa hora, os retirantes estavam acampados às margens do Mar Vermelho. Ao saberem da aproximação do exército de Faraó, muitos judeus reclamaram de Moisés dizendo que se era para morrer no deserto, melhor teria sido nem sair do Egito. Outros quiseram se suicidar, outros se renderem e voltar para o regime de escravidão, que tinha lá suas comodidades.
Nessa hora, pressionado por todas essas circunstâncias, Moisés começa a orar a Deus, pedindo socorro. Deus, então, dá uma bronca em Moisés, dizendo: "Por que clamas a mim, Moisés? Estende a tua vara, toca o mar, que as águas se abrirão". Dito e feito. Moisés passa com o povo pelo meio do mar e se salva do exército inimigo.
A história não acaba, porém. Os judeus peregrinaram quarenta anos no deserto do Sinai antes de chegar à Terra Prometida. Foi um tempo de dureza, de sofrimento, de angústia e incertezas.
E o que o concurso tem a ver com isso? O concurso é a Terra Prometida. Mana leite e mel, que é outro nome que podemos dar para a estabilidade, o status, a aposentadoria diferenciada, os bons vencimentos e, em especial, a chance de fazer parte da administração pública, de fazer o país ser melhor, de ajudar o próximo sendo remunerado pelo governo. Mudar nossa vida... e mudar a vida de quem for ser atendido por nós, no serviço público.
Continuando: o que a história da páscoa pode dizer sobre passar em concursos? Muitas coisas. Separei sete para você.
Primeiro: é preciso ter um plano. É preciso imaginar a Terra Prometida e querer ir para lá. O primeiro passo é sonhar. Sem uma meta ninguém faz nada.
Segundo: As pessoas podem não acreditar em você e nem em seus planos. Problema delas. Você tem que acreditar em si mesmo e no projeto, mesmo que seja o único, ou melhor, mesmo que sejamos só nós dois: você mesmo e o autor desse artigo.
Terceiro: Você vai precisar, como Moisés, de abrir mão de alguns privilégios, de algum comodismo. Vai ter que abrir mão de uma série de atitudes e comportamentos contraproducentes. Não dá para passar em concurso agindo como se fosse filho de um rei... É preciso muito esforço, disciplina, dedicação e, claro, estudo.
Quarto: Não aja como aqueles judeus que reclamaram de Moisés. Eles queriam que Moisés resolvesse todos os problemas! Eles não estavam sequer ajudando quem liderava o processo de mudança. Assim, pare de reclamar dos outros e faça alguma coisa. Assuma o papel de protagonista da própria história. Jamais aceite a comodidade que a paralisia de projetos e de iniciativa oferece num primeiro momento.
Quinto: Não aja como Moisés, jogando toda a responsabilidade para Deus. Deus se interessa por você e vai operar milagres (afinal, Ele é quem abriu o mar), mas pare de ficar só com discursos e orações (só com projetos). É preciso tocar o mar para que ele se abra. É preciso abrir o mar, os livros, as provas etc. Passar em concursos é para quem tem sonhos... e tarefas. Faça sua parte.
Sexto: Antes de Canaã, havia um deserto. Todo ritual de passagem, em especial de passagem de uma situação ruim para um melhor, exige um período de preparação e sacrifícios. O período de estudo, disciplina, muito estudo, muitos simulados etc., o próprio período de aprender a ser preparar para concursos, tudo isso faz parte de um longo deserto onde você vai precisar passar para chegar ao seu objetivo. Sem deserto, sem terra Prometida. Mas com um detalhe: prometo para você que não vai ser preciso quarenta anos...
Sétimo: A Terra Prometida estava lá para os judeus, e estará lá para você. Tenho certeza que muitas vezes os judeus que peregrinavam há anos no deserto devem ter desanimado. Você, que já está há algum tempo nesse projeto já deve ter passado por momentos difíceis, ou pode estar em um deles exatamente agora. O que dizer sobre isso? Colega, a Terra Prometida continua lá! Lhe esperando! Faça sua jornada que você chega, não desanime. Calor? cansaço? sede? Tudo isso só vai realçar ainda mais sua vitória, que chegará se você fizer o mesmo que o povo judeu fez no deserto: caminhar. Caminhar na direção certa, caminhar com a ajuda de Deus, mas, inexoravelmente, caminhar até chegar.
Eu tenho certeza que você chegará ao seu destino, no tempo certo, após sua dose de deserto e caminhada. Até lá, boa sorte, e meus votos de boa páscoa.
William Douglas é juiz federal/RJ, mestre em Direito, especialista em políticas públicas e governo. www.williamdouglas.com.br
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